domingo, 29 de junho de 2008

Margem Sul



Eu gosto da "margem Sul".

Serra da Arrábida, Azeitão e Sesimbra, são lugares onde tenho raízes e laços familiares.
Quase todas as semanas, desfruto do prazer do contacto com a natureza na Serra da Arrábida.
E recordo com um sorriso, as férias que passava numa casa que os meus pais alugavam na Fonte da Telha, quando era muito pequeno.

Até há cerca de 25 anos, era comum chamar "Outra Banda" à margem Sul do Tejo da "grande Lisboa". Agora, só se usa "margem Sul".

Margem Sul, passou a ter para mim outro significado.
Não aquele que que me liga ao local, nem aquele que me dá prazer.

Há cerca de 5 anos, tive uma saída litigiosa da empresa onde trabalhava. O caso foi a tribunal e ganhei.
Quando existe uma luta judicial difícil para uma das partes, pega-se em tudo e mais alguma coisa para prejudicar a outra.
Ficou-me então gravada para sempre, a expressão de uma das testemunhas: "eu nunca cheguei atrasada e moro na margem Sul"! Isto porque eu, tinha dias em que demorava duas (sim, 2) horas para chegar a Lisboa pela A5.
Constatei assim, que "Margem Sul" não é um lugar. É uma condição e um desígnio.
"Margem Sul", é um indivíduo que se sente marginalizado por viver ali. Mesmo que disponha de duas pontes, de duas Auto-Estradas e do melhor comboio suburbano do país, é da "Margem Sul". Logo, é eternamente um marginalizado.
Porque em tempos, foram operários e filhos desses operários mal qualificados, que trabalhavam duramente para ganhar muito pouco.
Hoje, tudo mudou, mas manteve-se o culto por esse estigma.
Os "Margem Sul" alargaram-se para outros subúrbios de Lisboa. Também andam pelas linhas de Sintra e da Azambuja. E comportam-se todos da mesma maneira: conduzem em fila nas faixas do meio das Auto-Estradas a 90 Km/h. Porque a faixa da direita é para quem guia mal e para os pesados. Além disso, direita é um espaço maldito para os "margem Sul". E a faixa da esquerda serve para os loucos que querem desperdiçar gasolina em velocidade.

Os carros dos "margem Sul", têm sempre uma lâmpada fundida ou um farol a apontar para os olhos das pessoas. E só acendem as luzes dos automóveis, quando não se vê rigorosamente nada.
Os "Margem Sul", nunca fazem horas extraordinárias. Cumprem escrupulosamente os seus horários de trabalho, e correm como loucos para as filas de trânsito das 17 ou das 18h. E ai daquele que lhes tire os 5 metros de espaço que têm à frente. Adoram filas para tudo: para o almoço, para as caixas do supermercado, para os bancos, tudo. É um hábito genético.
Os "Margem Sul", só se divertem nos Centros Comerciais. E amam as suas terrinhas com casas de concepção de construtor "pato-bravo" e com cafés cheios de espelhos.
Politicamente são de esquerda, não por convicção, mas por conveniência. E aqueles que saltaram essa barreira de Berlim que é a condição de "Margem Sul", já esqueceram de como eram, em quem votaram, e insultam quem os relembra de como foram.


há-de ser post noutro lado